terça-feira, 17 de abril de 2012

Os Nossos Poetas


QUESTÕES

Diz-me o que te disse o mar
na pesca restolhada do teu sono leve
em viagem de batel dorso
de proa aberta e festiva,
no remanso vivo,
na revolta de um dia fosco ?

Diz-me onde está o sargaço húmido inquebrantável
ao levante distante?

Diz-me?

Sem pestanejar,
de lábios abertos
vou-me atirar…

Jaime Portela


Quando minha voz se cala,
Recorro ao silêncio da noite,
Acendo uma página de sol,
E deixo acordar as palavras,
Nos lençóis brancos de linho,

Escuto o riso cristalino das letras,
No embarque de minha voz,
Por águas de-compostas de metáforas,
Emudeço-me…
Porque gosto de estar calada,
Desenhando círculos e pessoas,
Paisagens que me habitam com voz,
Movimento-me nas águas paradas,
Libertando a poeira de meu dia,
Por vezes, sinto minha voz intocável,
A língua seca, a garganta em asfixia,
Surdamente…
O farol se acende, me abre sulcos,
Molhando todas as páginas de escrita,

Por vezes sinto a voz rouca, silenciosa,
Presa num labirinto de tinta e gestos,
Cativa-me… Cala-me…
Ensurdecendo.me…
E minha voz deixa de ter ouvidos,
É voz sem voz que me grita,
Plagiando-se neste acordar sem som,
Voz poema escrevendo-se em corrente,
Desaguando como rios… em foz de letras,

[A voz cala-se-me… no rio de letras]

Cristina Correia


“AMOR”

O amor nasce em nós como luzinha
Das cinzas que o bom vento despertou…
Como a asa que nasce à andorinha
... Na casa que o amor edificou…

Amor são nuvens de oiro, pela tardinha,
No céu de um coração que outro encontrou.
São flores vivas dentro da ermidinha.
Que o amor do povo ergueu e sustentou…

Amor? Sei lá! A rosa no seu ramo
Não sabe o que é perfume…e todavia
Ela encanta e seduz-nos todo o ano!

A candeia não sabe se alumia…
Eu, também não sei bem porque é que amo,
…Mas sinto o amor crescer de dia em dia…

Alfredo Costa Pereira


SEM FIM

Pronto,
É agora,
As linhas estão contadas.
Como em estágio terminal,
O computador está para ser desligado,
Portanto, o ponto final precisa ser dado
E eu me nego.

Não quero dar por finalizadas,
Ideias que não julgo prontas.
Não quero dar por terminada,
A dança rítmica que me permitiu,
Bailar nas letras,
Envolver as palavras e assim me
Deixar levar noites e dias sem parar.

Não,
Não vou deixar esta festa acabar,
Não,
Não quero que escolhas outro par,
Não agora, que envolta em fantasia,
Descobri a beleza, nobreza e magia,
Deste encanto eterno que é a poesia!

Guria da poesia Gaúcha


Quem não conhece uma lágrima
Que cai no rosto
Seu percurso se advinha

Vai rolando
Devagar
Lentamente…

Uma simples lágrima que rola
Textura de cristal, sabor a sal
Tão minúscula
O seu peso pode ser grandioso
Quando pensarmos
Que uma simples gota,
Uma lágrima
Trás na bagagem

Sentimentos de dor
De sangue da alma
Saudade
Emoção do coração

Mas também pode ser de alegria
Como aquela que gosto e rolam por magia

A cada sensação da vida,
Que descubro
A cada abraço
A cada minuto
Elevo os meus braços aos céus
Por estas lágrimas de felicidade
Que rolam dos meus olhos…

Carla Gomes


VONTADE DE TE AMAR

Não te tenho
Não te invento
Não te sinto neste meu fado
Tenho os olhos cheios de mar
Tenho os dedos para te afagar
E o meu peito é o teu peito a ele colado
Não te minto
Não te sinto
Não te quero só por querer
Tenho os braços à tua espera
A minha pele será a tua primavera
Nas flores que em mim fazes crescer
Não te vejo
Não te beijo
Não ouço as tuas palavras suaves
Tenho o corpo de mim ausente
Tenho alma mas ninguém a sente
E as horas vão no voo das aves
Não te sorrio
Não te silencio
Não consigo desenhar a tua boca
Tenho as mãos cheias de vontade
Tenho a alma plena de saudade
E a gaivota que em mim habita sente-se louca
Não te abraço
Não te tenho em mim
Não quero viver sem te ter comigo
Tenho o tempo que me faz feliz
Tenho a esperança que tudo me diz
E quando chegares todo o céu será o meu abrigo.

José Luís Cordeiro


Partilhas

Há muito partiram meus pais
Deixando a casa trancada…
Não fizeram as malas
Não arrumaram a tralha.
Foram simplesmente de viagem…
Dormiram no cansaço dos corpos
Deixando que o sono os levasse
Não, não voltam, tão longa é a estrada.

A casa, essa
Continuava trancada
Guardando os segredos dos sorrisos
Das gargalhadas
Das conversas segredadas
De uma vida

Ali os filhos nasceram,
Cresceram…
Brincaram e correram
Fizeram a sacola e foram à escola…

Também fui, não me esqueço
Mas, como outros, nada aprendi!
(…)
Recusei-me a abrir as portas
Mas a hora das partilhas é chegada.

Vamos carregar o machado
Esquartejar parede e telhado
E até o vão da janela será derrubado.

Não importam as conversas de irmãos
Nem o chapéu de meu pai pendurado atrás da porta…

As roseiras no jardim já choram…
Plantara-as minha mãe!
(…)
A entrada está trancada
Mas cá fora ainda cheira a pão centeio,
Amassado com suor…
A forno de lenha, aquecido com carinho e cansaço…

Já esquecera, mas está lá!
Não importa, há partilhas.

Os lenhadores vêm aí!
Machado em punho,
As partilhas não demoram,
Os meus pais, esses também não se importam,
Continuam de viagem!

Céu Cruz


QUERO TE SEGUIR

Quero ser humilde,
Sem falsa demagogia!
Já que gosto
De andar descalça,
Sentir a terra que gira,
Compacta,
Sob meus pés!
Quero me sentar no chão,
Ao lado dos bons,
Sem cerimônia!
Gosto dessa sensação
De despojamento total...
Não quero almejar
As riquezas humanas,
Tão desumanas!
Agora busco, além,
Minha redenção!
Só assim me vejo
Um pouco mais digna
De caminhar,
Pisando nas Tuas pegadas!
Só assim, também,
Sinto ser menos culpada,
Pela herança como ‘filha’
Dos Teus algozes!
Preciso sim andar livre
Daquela poeira suja,
Impregnada
Nas Tuas sandálias!
Ah! Tuas sandálias!
Não quero mais
Tê-las por relíquia,
Estas testemunhas-vilãs,
Dos minutos malditos,
De Tua dura caminhada
Até o Calvário!
Só assim posso me sentir
Um pouco menos pagã!
E de joelhos me prostro
Diante dos verdadeiros
Ensinamentos Teus!
Meu grande Mestre
Do amor!
Meu maior amor
Em forma de Deus!

Patrícia Zago

Nenhum comentário:

Postar um comentário