sábado, 15 de junho de 2013

José Brites Marques Inácio

POR FAVOR, SILÊNCIO...
(JBMI)

Tenho visto o silêncio, escrito por aí, recitado além 
e também dançado sem regra sob magnólias floridas
mas desacompanhadas em seu basto esperar.

Bateu-me ao postigo um silêncio arrebatado e forte
já sem vergonha nem grão, o desenfreado chegante,
pardacento, núvem de pólvora sem fósforo nem chama.

Transfixivo, atingiu-me visceralmente o traiçoeiro,
sem a dignidade de um filme mudo com frames separadas
por intervalos de luz. Trazia bandeira de ocupante.

Mais frio que o inverno, mais alto que o despudor,
sem anúncio nem palavra foi-me arrancando, um a um,
os embargados silvos adormecidos na garganta.

Passados muitos anos de viva voz e muito alarido
não julgaria possível o telhado coberto de tanta noite
na soma de línguas, epiglotes e pulmões tão sem préstimo.

Num último assomo de dignidade, esfriada mas biliosa,
sem nada dizer, soltei-me por impulsivo reflexo brusco
e galguei pela única janela com vistas para coisa nenhuma.

Foi a absoluta noite que me ergeu sobre tufos de ervas
onde mais ninguém me ouviu cair, de manto preto azeitona,
cedo de mais para uma cigarra ou uma brisa longínqua.

Despejado assim, comecei por recitar o silêncio da terra,
a última peugada da primavera antes da noite fria,
o rio que desagua entre dentes no mar que não arriba.

Inebriei-me desse silêncio côncavo que me não largou mais,
limpei à pressa duas lágrimas intrigadas de abandono
não fosse este torrão amado escutar duas hermíneas cascatas

em noite fria
num lar esventrado
com as almas em silêncio de grilhões... 

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